Nas últimas semanas, a pauta do clima e das mudanças climáticas esteve no centro das discussões mundiais, da imprensa, dos governos, das demandas dos movimentos ambientalistas e setores da sociedade civil (proposta TIC TAC, action day etc). Nunca se noticiou tanto sobre o tema, expectativas foram criadas, frustrações anunciadas, discursos feitos. Mas, o que de fato aconteceu, na Dinamarca, nas últimas semanas, o que existe de resultados efetivos, o que o Governo da Bahia tem elaborado como políticas públicas de mitigação aos efeitos do câmbio climático?
De fato, Copenhague representou mais do que uma etapa da complexa engenharia global sobre clima, mas a expectativa de milhões, talvez bilhões de pessoas no mundo todo sobre medidas concretas e obrigatórias que pudessem alterar o caminho adverso que cientistas do IPCC (Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas) têm apontado em seus relatórios periódicos (reports).
A COP15, décima quinta conferência de partes da Convenção do Clima – desde a ECO 1992, Rio de Janeiro -, reuniu 193 nações na tentativa de elaboração de uma agenda global sobre o tema, e teve sim resultados, como: as nações concordaram em cooperar na redução da emissão dos gases do efeito estufa, apesar de não serem fixadas metas obrigatórias; as nações mais pobres elaborarão a cada dois anos relatórios sobre as medidas voluntárias para redução das emissões; relatórios das nações estão sujeitos a consulta e análise internacional; nações desenvolvidas, incluídos os Estados Unidos, providenciarão dez bilhões de dólares a cada ano para apoiar nações pobres na mitigação dos efeitos do clima e desenvolvimento tecnológico; por fim, nações ricas procurarão mobilizar cem bilhões de dólares por ano para um fundo global sobre mudanças climáticas até 2020.
Com efeito, importante salientar que, apesar de não conseguir ser elaborado documento obrigatório na COP15, não pode ser desprezada a característica do Direito Internacional Ambiental sobre o caráter gradual e progressivo de seu aprimoramento. Contudo, resta indagar se ainda temos tempo para continuar um modelo de desenvolvimento predatório, consumista e insustentável, que domina o cenário do modo de produção capitalista? O último relatório do UNFPA (Fundo das Nações Unidas para Populações) indica que os efeitos das mudanças do clima serão desproporcionais e ameaçarão uns mais do que outros: mulheres são muito vulneráveis, assim como, diante da realidade brasileira, quilombolas, comunidades indígenas, ribeirinhos etc.. De outra forma, estudo recente da UFBA, em parceria com o INGÁ, autarquia da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, indica uma relação direta entre clima e efeitos sobre os recursos hídricos, com conseqüências bastante graves na diminuição dos estoques de água nas bacias estaduais de 2070-2100.
O Brasil teve participação destacada em Copenhague, com apresentação de proposta concreta de metas de redução de emissões. O Presidente Lula foi figura pública destacada na Dinamarca, chamando os líderes mundiais à responsabilidade sobre o câmbio do clima. A Bahia esteve na COP15, participou da delegação brasileira, e fez intervenção no evento social KlimaForum2009 sobre “mudanças climáticas, desertificação e populações tradicionais”. Ademais, necessário registrar o esforço do Governo da Bahia em construir políticas públicas sobre o tema: a criação do Instituto de Gestão das Águas e Clima (INGÁ) em 2008; a indicação legal da sua atribuição como órgão executor da Política de Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas e à Desertificação (Leis 11.050/2008 e 11.612/2009); a construção participativa do Plano Estadual de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca; a criação do Centro de Meteorologia da Bahia, CEMBA/INGÁ; discussões e encaminhamentos do Conselho Estadual de Recursos Hídricos e do Fórum Baiano de Mudanças Climáticas e Biodiversidade; a proposta do projeto de lei sobre a Política Estadual de Mudanças Climáticas; lançamento de edital de recuperação de matas ciliares em todo o Estado; a implementação do Fundo Estadual de Recursos Hídricos; os Encontros pelas Águas com as comunidades tradicionais, convênios com o IICA (Instituto Interamericano para a Agricultura), UNFPA e UNESCO, inclusive na elaboração do relatório de vulnerabilidade das comunidades às mudanças climáticas.
Em suma, o tempo é de fazer, inclusive da maior participação sub-nacional na esfera internacional, como por exemplo, a parceria que a Bahia tem feito com a África, e da própria sociedade organizada. O tema das mudanças climáticas exige postura ética coletiva e compromisso com todos os atores, principalmente o poder público e os setores de produção e consumo.
* Julio Cesar de Sá da Rocha, Diretor Geral do INGÁ (Instituto de Gestão das Águas e Clima), Doutor em Direito Ambiental, Professor da Uneb, ex Superintendente do IBAMA na Bahia, da delegação brasileira na COP15.
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